Autora: Ayako Miura*
Tradução: Thiago de Paula Cruz
No campo de concentração de Auschwitz não havia quem não conhecesse o nome do padre Kolbe que ofereceu voluntariamente sua vida e morreu no lugar de um prisioneiro.
Quando o tufão chamado Tôya Maru** atingiu Hokkaido em 1954, dois missionários deram coletes salva-vidas para jovens japoneses que mal conheciam e perderam suas vidas para o mar tempestuoso. Esta é uma história real que está escrita em meu romance “Ponto de Congelamento”.
E ainda em 1912, na Garganta Shiokari de Hokkaido, Masao Nagano, de repente e sem pensar muito, para salvar os passageiros do vagão do trem, jogou o próprio corpo nos trilhos e deu cabo de sua preciosa vida. Isto também está escrito em detalhes em meu romance “Garganta Shiokari”.
Todos esses três incidentes comunicam a morte sacrificial de cristãos. Não há quem não se comova profundamente ao ouvir essas histórias. Mas enquanto são atingidos profundamente na alma, também pensam:
“De jeito algum eu sou capaz de imitá-los. Eles foram capazes por serem pessoas que habitam um mundo diferente.”
Esse é o tipo de expressão que ouço várias e várias vezes. Quanto a este assunto, certa vez tive a experiência de discutir com minha irmã mais velha. Ela disse:
“Eu também não sou capaz de imitá-los.”
Naturalmente, eu também pensava da mesma forma. Porém, dessa vez, ela continuou a falar:
“Nós de modo algum podemos oferecer a própria vida, mas se fosse uma coisa pequena não seríamos capazes de oferecê-la?”
“É verdade”, pensei. Caso seja um pequeno sacrifício, talvez possamos oferecer. Por exemplo, não poderia cortar e oferecer para uma pessoa doente a rosa mais bonita a florescer em meu jardim?
Quando pensei dessa forma, ao considerar oferecer alguma coisa, percebi que posso oferecer mais e mais. Em outras palavras, mesmo que esteja ocupada, não consigo separar tempo suficiente para alguém ao longo do meu dia? Telefonar, escrever, apenas orar por essa pessoa seria bom. Penso que o ponto é: não podemos começar a partir de um pequeno passo?
Referência:
MIURA, A. Chiisana ippo kara. In: ______. Chiisana ippo kara. 4.ed. Tóquio: Kodansha, 2000. p.194-195.
*Nota do tradutor: Até onde sei, este é o primeiro texto completo traduzido da escritora japonesa cristã Ayako Miura para nossa amada língua portuguesa. Embora curto, é importante que sigamos o conselho útil apresentado a todo cristão: “não podemos começar a partir de um pequeno passo”?
**Nota do tradutor: Chamado de “Marie” em outros países, esse tufão afundou o navio Tôya Maru no Estreito Tsugaru situado entre as ilhas de Hokkaido e Honshû e recebeu seu nome em lembrança a esse desastre. O número exato de mortos e desaparecidos não pôde ser definido, mas estima-se que 1361 pessoas morreram e em torno de 400 desapareceram. Os dois missionários mortos eram: Alfred Russel Stone e Dean Leeper. Há registros de que ao darem os coletes salva vidas aos jovens que mal conheciam disseram “Agora no Japão vocês, jovens, são necessários”.
Agradam me imensamente o modo de sensibilidade típico das culturas ocidentais. Eles tem uma prática espiritual, não costumam separar mente x corpo, teoria x prática, espírito e carne. Não à toa, muitas de suas disciplinas como Kung Fu, Tai Chi, Feng shui (salvo engano ortográfico…) transmitem uma integração muito além do que podemos normalmente imaginar.
E que os seus líderes religiosos transmitam liberdade, paz e desapego de si mesmos que nós ocidentais não podemos sequer compreender. É claro que em muitos pontos somos inferiores, menos desenvolvidos. Ponto. E infelizmente carecemos de maturidade, o que procuramos camuflar julgando como inferior os mesmos bens superiores que desconhecemos totalmente (psicologia da projeção e argumentum ad ignorantiam).
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Muito emocionante!!! Gostaria de ler no original em japonês um dia!!! Estas poucas linhas me fez lembrar que houve um grupo de imigrantes japoneses cristãs que fugiram do Japão e se acomodaram na cidade de Promissão, e lá conseguiram libertar das perseguições religiosas que haviam na época no Japão e assim segue a história. A outra foi na época de tsunami, uma velhinha ao receber o seu oniguirfi, unica alimentação distribuida para as vitimas sobreviventes, ela disse que iria comer somente um e que desse o outro para um jovem que poderá viver mais e fazer ações de bens para a comunidade;sociedade. Tantas lindas historias para a gente se emocionar e refletir. Obrigada por compartilhar comigo.Yoko Nakaema
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Essa história é bem emocionante mesmo! E as que você descreveu também são, Yoko! Sou eu que agradeço por tê-las compartilhado comigo também! ^_^ São histórias que não apenas emocionam, mas também edificam como você mesma falou!
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